“Por que a minha linguagem não é clara para vocês? Porque são incapazes de ouvir o que eu digo” – João 8:43 . NVI
Este verso do livro de João precede palavras pesadas contra muitos que na época se diziam filhos de Deus. Isso porque a retórica não praticada, além de ter o mesmo efeito da mentira, parece tornar ainda mais agudas as dores que nós sentimos a cada vez que deixamos a nossa humanidade exercer domínio sobre o plano Deus em nossas vidas. Neste caso então nos tornamos parecidíssimos com o diabo, e neste capítulo de João, o termo usado é Filhos do diabo, se justificando da seguinte forma: O diabo foi um ser que não quis se apegar a verdade, e por isso, não há verdade nele.
Mas chega de falar em diabo, e vamos falar de nós mesmos, cristãos do século 21, que uma vez comprometidos com a tarefa evangelização, tornamo-nos automaticamente missionários, e não digo missionários potenciais, mas: “Missionários”! (notem o “M” maiúsculo). Responsáveis portanto pela propagação do evangelho (leia-se o modo de vida cristão) ao mundo.
Sim! A verdade liberta! E isso fica bem claro e bem evidente em praticamente todas as seitas e religiões do planeta, entretanto, a liberdade em si não consiste em simplesmente conhecê-la, mas em vivê-la. Eu até tomaria a liberdade de contextualizar da seguinte forma: Se você viver a verdade, a verdade o libertará.
Nos dias de hoje, em pleno o mundo capitalista, fica difícil admitir que nós cristãos estejamos de fato “vivendo” a verdade, já que muitos trechos da Bíblia não se encaixam ao modo de vida da avassaladora maioria dos cristãos, que se justificam apenas dizendo: ´sou pecador!´ - E quem não é pecador, então que atire a primeira pedra... Mas o fato é que para vivermos a verdade, teríamos que por exemplo, repartir tudo o que temos e ganhamos com nossos irmãos. Pensa só: nós teríamos que ir a igreja, entregar todos os nossos bens, e então reparti-los por igual com nossos irmãos, ao ponto de todos terem tudo em comum, sobretudo VERDADE, LIBERDADE e “IGUALDADE” (como lemos em Atos 2:42-47)
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Há cerca de 30 anos atrás, entre os ditos cristãos de vanguarda surgiu a discussão que até hoje seduz muitos dos nossos missionários; naquela época, o título emprestado pela igreja católica foi Aggiornato, ou Missionários-Aggiornati, que depois de conviverem entre os índios que evangelizavam passaram a defender a idéia de que dia após a dia, o modelo tribal se tornaria o ideal para a sociedade do futuro, já que neste modelo, não há mandões ou ditadores. Um cacique, por exemplo, não é mais que um líder-conselheiro e tudo se resolve com o consenso de todos. Entre os índios não existem fazendeiros nem colonos, patrões nem empregados, proprietários nem marginalizados, ricos nem pobres, não existem repartições, taxas, impostos e todo o mais que nós, os ditos civilizados, as vezes denominamos “o inferno na terra”. Enfim, não há nada na sociedade tribal que divida ou hierarquize a ponto de intervir no que é essencial. A nudez entre os sexos é completa (ou quase) e não gera pornografia. Todos andam ‘bem a vontade´ pela floresta a procura de petiscos como pequenos animais, peixes, aves e ou frutos. De volta a aldeia, repartem entre as famílias tudo o que pegaram; e ninguém quer ser mais do que ninguém, nem pensa muito no dia de amanhã... É, como dizem muitos etnólogos, “O Paraíso na terra”.
Talvez a pergunta agora na sua cabeça seja: E eu? Até quando vou ficar aprisionado a esta vida que levo?
A resposta está na (me perdoem o eufemismo) verdadeira-verdade-que-liberta. Aquela que os cristãos pós-modernos insistiram em não viver, e ainda deram pressuposto para autores como Weber publicar que a ética cristã é prisioneira do modo de vida capitalista.
Mas peraí! (você vai dizer) O mundo está de cabeça para baixo, e os índios que vemos na televisão já não andam nus, nem seu modo de vida condiz a descrição aqui citada, e é justamente aí que missiológica ridícula no Brasil, dá-se de maneira ainda mais vergonhosa. Foram os cristãos que conceberam um conceito missiológico que se apresentava mais ou menos assim:
- Como fim, evangelizar;
- Evangelizando, “civilizar”;
- Civilizando, fazer o bem.
Talvez seja o momento de sermos realistas e demonstrar ao menos resistência a certas missiológicas ridículas, que às vezes afetam todo o futuro de um povo, no caso do Brasil até de uma nação, mas antes de tudo, reconhecer que a menos que tenhamos morrido em nossa alma e convicção cristã devemos voltar ao primeiro amor e compreender que somente a medida que de fato amarmos uns aos outros vamos conhecer melhor a Deus, e conhecendo-O melhor, nos apegaremos mais a verdade, pois ao vivê-la, seremos então livres, e portanto um referencial de sociedade, já que isso sim tem a ver com “Ser Igreja”. Muito de nós esvaímos em lágrimas a cantar que estamos preparando, penteado, deixando linda a Noiva de Cristo. Mas será que essa noiva é o tipo de exemplo a ser seguido?
Me diz com quem andas, o modo como vive, e ainda assim eu não te direi quem és, pois a retórica não praticada é a mesma coisa que a mentira... E a missiológica permanece ridícula.
“Por que a minha linguagem não é clara para vocês? Porque são incapazes de ouvir o que eu digo” – João 8:43 . NVI